quarta-feira, 23 de julho de 2014

PARECER SOBRE A LEI FEDERAL 12.994/2014. PISO NACIONAL DOS ACS E ACE.


CONSELHO DE SECRETARIAS MUNICIPAIS DE
SAÚDE DO ESTADO DO PARÁ – COSEMS/PA
CNPJ: 00.636.190/0001-38

PARECER SOBRE A LEI FEDERAL 12.994/2014, QUE INSTITUIU O PISO NACIONAL DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE E DOS AGENTES DE COMBATE ÀS ENDEMIAS.

         A lei federal de n. 12.994, de 17 de junho de 2014, alterou alguns artigos da lei federal 11.350, de 5 de outubro de 2006, com a finalidade de instituir piso salarial profissional nacional e diretrizes para os planos de carreira dos Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias.

         Em seu artigo 1º, a citada lei estabelece um piso salarial nacional. Vejamos:

Art. 9o-A.  O piso salarial profissional nacional é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das Carreiras de Agente Comunitário de Saúde e de Agente de Combate às Endemias para a jornada de 40 (quarenta) horas semanais.
§ 1o  O piso salarial profissional nacional dos Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias é fixado no valor de R$ 1.014,00 (mil e quatorze reais) mensais.
§ 2o  A jornada de trabalho de 40 (quarenta) horas exigida para garantia do piso salarial previsto nesta Lei deverá ser integralmente dedicada a ações e serviços de promoção da saúde, vigilância epidemiológica e combate a endemias em prol das famílias e comunidades assistidas, dentro dos respectivos territórios de atuação, segundo as atribuições previstas nesta Lei.”

         Verifica-se, assim, que a União estabeleceu um piso salarial mínimo pelo trabalho em regime de quarenta horas semanais pelos Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Controle de Endemias no valor mensal de R$1.014,00 (mil e quatorze reais).

         Importante ressaltar que a lei não fixa como obrigatória a carga horaria de 40 (quarenta) horas semanais, porém estabelece que o piso fixado é calculado com este valor. Desta forma, caso a carga horaria específica de cada município seja diferente, deve ser calculado o piso horário com a divisão do valor fixado por 200 e multiplicação pela quantidade de horas mensais. Por exemplo, em regime de 36 horas semanais, o piso seria de R$912,60, e de R$1.115,40 para 44 horas semanais.

         A fixação de carga horaria constante da lei somente se refere ao calculo do valor do piso, não importando dizer que a carga horaria de todos os ACS e ACE passou a ser de 40 horas semanais.

         No entanto, entende-se ainda que toda a jornada de trabalho das categorias deve ser dedicada a “a ações e serviços de promoção da saúde, vigilância epidemiológica e combate a endemias em prol das famílias e comunidades assistidas, dentro dos respectivos territórios de atuação”.

         Discute-se ainda se o valor do piso salarial iria abranger adicionais acrescidos de acordo com normas municipais específicas. Ocorre que a lei não é clara sobre o assunto, porém temos que analisar como paradigma o acórdão da Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI4167 do Supremo Tribunal Federal que entendeu que piso salarial mencionado na norma referente ao piso nacional dos professores compreenderia apenas o salario base. Abaixo transcrevo trecho relevante:

“Ementa: CONSTITUCIONAL. FINANCEIRO. PACTO FEDERATIVO E REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIA. PISO NACIONAL PARA OS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA. CONCEITO DE PISO: VENCIMENTO OU REMUNERAÇÃO GLOBAL. RISCOS FINANCEIRO E ORÇAMENTÁRIO. JORNADA DE TRABALHO: FIXAÇÃO DO TEMPO MÍNIMO PARA DEDICAÇÃO A ATIVIDADES EXTRACLASSE EM 1/3 DA JORNADA. ARTS. 2º, §§ 1º E 4º, 3º, II E III E 8º, TODOS DA LEI 11.738/2008. CONSTITUCIONALIDADE. PERDA PARCIAL DE OBJETO. 1. Perda parcial do objeto desta ação direta de inconstitucionalidade, na medida em que o cronograma de aplicação escalonada do piso de vencimento dos professores da educação básica se exauriu (arts. 3º e 8º da Lei 11.738/2008). 2. É constitucional a norma geral federal que fixou o piso salarial dos professores do ensino médio com base no vencimento, e não na remuneração global. Competência da União para dispor sobre normas gerais relativas ao piso de vencimento dos professores da educação básica, de modo a utilizá-lo como mecanismo de fomento ao sistema educacional e de valorização profissional, e não apenas como instrumento de proteção mínima ao trabalhador. 3. É constitucional a norma geral federal que reserva o percentual mínimo de 1/3 da carga horária dos docentes da educação básica para dedicação às atividades extraclasse. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. Perda de objeto declarada em relação aos arts. 3º e 8º da Lei 11.738/2008. (STF - ADI: 4167 DF , Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 27/04/2011, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-162 DIVULG 23-08-2011 PUBLIC 24-08-2011 EMENT VOL-02572-01 PP-00035)

         A própria Constituição Federal em seu artigo 198, § 5º, estabeleceu que caberia o estabelecimento por lei federal do piso salarial dos Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Controle de Endemias. É importante fazer este registro em razão de que em decorrência da previsão Constitucional do piso, poderá ser dada a mesma interpretação adotada pelo Supremo Tribunal Federal com relação ao piso dos professores, também previstos Constitucionalmente.

         No referido julgado, o STF entendeu que o legislador constituinte estabeleceu previsão constitucional sobre o tema exatamente em razão da sua relevância, razão pela qual o piso deveria ser o salário base e não a remuneração, apesar de comumente ser entendido de forma diversa, pois se configuraria em um privilégio de importância dada ao professor em razão da necessidade do desenvolvimento da educação básica, o que também se aplicaria aos ACS e ACE com relação a necessidade de desenvolvimento da saúde pública.

         Trata-se de uma interpretação que pode e deve ser dada por cada ente municipal até a manifestação interpretativa judicial de forma contrária, até porque existem pressupostos diferentes das carreiras apresentadas, inclusive a submissão dos ACS e ACE à Consolidação das Leis do Trabalho onde não há cargo efetivo criado em lei pelo município.

         Registrando-se, no entanto, o risco de criação de um passivo sobre eventuais diferenças de pagamento em decorrência de interpretação judicial futura de forma diversa.

         O artigo que estabeleceu o piso salarial não depende de regulamentação, sendo auto aplicável, e, portanto, vigente desde a publicação da lei, ou seja, devido desde 17/06/2014.

         Passamos agora a analisar os demais artigos da lei e para facilitar a compreensão, efetivaremos comentários em seguida da transcrição de cada trecho da norma.

Art. 9º-C.  Nos termos do § 5o do art. 198 da Constituição Federal, compete à União prestar assistência financeira complementar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, para o cumprimento do piso salarial de que trata o art. 9o-A desta Lei.
§ 1o  Para fins do disposto no caput deste artigo, é o Poder Executivo federal autorizado a fixar em decreto os parâmetros referentes à quantidade máxima de agentes passível de contratação, em função da população e das peculiaridades locais, com o auxílio da assistência financeira complementar da União.
         O caput do artigo 9-C apenas transcreve o que se encontra previsto na Constituição. O parágrafo primeiro do artigo 9-C se configura no único item da norma que depende de edição de norma regulamentadora, ou seja, um decreto que irá fixar o quantitativo de agentes para cada município em decorrência de sua população e o auxílio financeiro que será prestado pela União.
§ 2o  A quantidade máxima de que trata o § 1o deste artigo considerará tão somente os agentes efetivamente registrados no mês anterior à respectiva competência financeira que se encontrem no estrito desempenho de suas atribuições e submetidos à jornada de trabalho fixada para a concessão do piso salarial.
§ 3o  O valor da assistência financeira complementar da União é fixado em 95% (noventa e cinco por cento) do piso salarial de que trata o art. 9o-A desta Lei.
§ 4o  A assistência financeira complementar de que trata o caput deste artigo será devida em 12 (doze) parcelas consecutivas em cada exercício e 1 (uma) parcela adicional no último trimestre.
         Os § 2º, 3º e 4º apenas especificam a forma com que a União irá calcular e pagar a assistência financeira para o pagamento do piso salarial dos agentes.
§ 5o  Até a edição do decreto de que trata o § 1o deste artigo, aplicar-se-ão as normas vigentes para os repasses de incentivos financeiros pelo Ministério da Saúde.
         O parágrafo quinto é importante no ponto em que estabelece que enquanto não elaborado decreto regulamentando o § 1º, do artigo 9-C, as atuais normas vigentes permanecerão aplicáveis, ou seja, a forma de calculo do quantitativo de profissionais poderão ser contratados pelos municípios com auxílio financeiro da União.
§ 6o  Para efeito da prestação de assistência financeira complementar de que trata este artigo, a União exigirá dos gestores locais do SUS a comprovação do vínculo direto dos Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias com o respectivo ente federativo, regularmente formalizado, conforme o regime jurídico que vier a ser adotado na forma do art. 8o desta Lei.”
         O parágrafo sexto apenas estabelece que o Município deverá comprovar que contratou o agente através das normas da CLT ou de regime jurídico previsto em lei local.
Art. 9º-D.  É criado incentivo financeiro para fortalecimento de políticas afetas à atuação de agentes comunitários de saúde e de combate às endemias.
§ 1o  Para fins do disposto no caput deste artigo, é o Poder Executivo federal autorizado a fixar em decreto:
I - parâmetros para concessão do incentivo; e
II - valor mensal do incentivo por ente federativo.
§ 2o  Os parâmetros para concessão do incentivo considerarão, sempre que possível, as peculiaridades do Município.

O artigo 9-D estabelece a criação de um incentivo financeiro para custeio das politicas de atuação dos agentes de combate as endemias e dos agentes comunitários de saúde, o que também dependerá de decreto regulamentador, porém não dispõe de uma norma de transição, não sendo, portanto, ainda aplicável.
 “Art. 9º-E.  Atendidas as disposições desta Lei e as respectivas normas regulamentadoras, os recursos de que tratam os arts. 9o-C e 9o-D serão repassados pelo Fundo Nacional de Saúde (Funasa) aos fundos de saúde dos Municípios, Estados e Distrito Federal como transferências correntes, regulares, automáticas e obrigatórias, nos termos do disposto no art. 3o da Lei no 8.142, de 28 de dezembro de 1990.
Art. 9º-F.  Para fins de apuração dos limites com pessoal de que trata a Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, a assistência financeira complementar obrigatória prestada pela União e a parcela repassada como incentivo financeiro que venha a ser utilizada no pagamento de pessoal serão computadas como gasto de pessoal do ente federativo beneficiado pelas transferências.”

         Trata-se da regulamentação da forma como será efetivada a contabilidade dos incentivos financeiros repassados e dos gastos de pessoal pagos. Da mesma forma que estabelece um incremento de receito do ente federado municipal, também fixa o local em que será inserido o gasto, nos termos já estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

Art. 9º-G.  Os planos de carreira dos Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias deverão obedecer às seguintes diretrizes:
I - remuneração paritária dos Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias;
II - definição de metas dos serviços e das equipes;
III - estabelecimento de critérios de progressão e promoção;
IV - adoção de modelos e instrumentos de avaliação que atendam à natureza das atividades, assegurados os seguintes princípios:
a) transparência do processo de avaliação, assegurando-se ao avaliado o conhecimento sobre todas as etapas do processo e sobre o seu resultado final;
b) periodicidade da avaliação;
c) contribuição do servidor para a consecução dos objetivos do serviço;
d) adequação aos conteúdos ocupacionais e às condições reais de trabalho, de forma que eventuais condições precárias ou adversas de trabalho não prejudiquem a avaliação;
e) direito de recurso às instâncias hierárquicas superiores.”

         Trata-se de artigo em que é estabelecido como deverão ser os planos de carreira dos ACE e ACS, especificando cada um dos critérios que devem ser levados em consideração no seu estabelecimento. No entanto, importante registrar que a lei não obrigou a criação de planos de carreira, apenas estabeleceu as diretrizes que devem ser observadas quando da sua realização, razão pela qual não se constitui de obrigação do ente municipal legislar sobre o assunto.

Art. 16.  É vedada a contratação temporária ou terceirizada de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias, salvo na hipótese de combate a surtos epidêmicos, na forma da lei aplicável.”

         O artigo 16 foi acrescido à lei para vedar a contratação temporária ou terceirizada de ACS ou ACE, abrindo como exceção apenas a ocorrência de sustos epidêmicos, o que deverá ser objeto de declaração e comprovação.

         Importante ressaltar é que ficam vedadas as contratações de cooperativas ou empresas para executar o serviço diretamente, bem como a contratação de agentes sem o devido concurso ou processo seletivo simplificados, os quais devem ser distratados de imediato.

         Registra-se que deve ocorrer concurso público apenas quando há a criação de cargo para a carreira perante os quadros do município, ocasião em que o agente será servidor efetivo e estável. Caso contrário, aplica-se o constante do artigo 8º da lei 11.350/2006, quando deverá ser realizado processo seletivo simplificado e a contratação pelo regime da CLT, sendo o agente servidor efetivo, porém não estável, podendo ser desligado nas formas já previstas na mencionada norma.

         O presente parecer não esgota o assunto, o qual dependerá ainda das diversas manifestações judiciais que ainda ocorrerão no futuro, o que poderá modificar totalmente a situação posta, inclusive com relação ao pagamento do salario base e a sua caracterização.

         São os termos,
         Belém, 17 de julho de 2014.

Napoleão Nicolau da Costa Neto

OAB-PA 14.360


DO AMIGO EDY GOMES!

2 comentários:

  1. Acho uma falta de respeito dá um salário exorbitante a uma categoria insignificante para a saúde, esse dinheiro deveria ser gasto com equipamentos ou outros profissionais realmente importantes para a saúde. Acho essa lei imoral e uma total falta de respeito com quem realmente trabalha.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Amigo ,também acho que vc não conhece nada de saúde pública, seus problemas e detrimentos. Entenda que em saúde pública, a saúde básica é prioritária. O que adianta ter muitos médicos ,grandes hospitais com uma ótima estrutura e vc não ter saneamento básico e saúde básica .Se essa categoria ,realmente,fosse valorizada, tendo salários dignos e justas condições trabalhistas, não teríamos esse caos na saúde que temos em todo país. Quando vc investe em saúde básica, que são aqueles que lidam com os problemas de frente, vc consegue ter um certo controle . O mecanismo que vc usou como priori, nada mais é que paliativo, não preventivo é curativo. Portanto, todos são importantes no processo saúde/doença. E com certeza, essa categoria é imprescindível.

      Excluir